O financeiro e a viabilidade

Ao se olhar para o ônibus deve-se contemplar o seu todo e não simplesmente o seu caráter da tração, como muitos pedem

Num mundo ávido por petróleo e lucros, ter a iniciativa da sustentabilidade ambiental pode ser considerada uma atitude enobrecida frente às poderosas mudanças climáticas, que já acontecem e estão por vir. Apesar do contexto da transição energética ser uma ação urgente em diversos setores da economia, como o transporte, por exemplo, é preciso que haja congruência entre o que se pratica e o que quer.

Vejamos o caso do transporte urbano brasileiro, aquele realizado pelo ônibus, sendo um setor que está sendo cobrado a promover mudanças em todos os sentidos. Neste caso, vamos ressaltar a sua tecnologia de tração, tendo o óleo diesel primordial participação em sua matriz energética.

A transição por algo mais limpo, como os bicombustíveis e a eletricidade, revela-se, para muitos, a urgência para a salvação do mundo. Porém, para aqueles com uma visão mais prática e sensata, o segmento de ônibus representa a oportunidade para se mostrar o quão de eficiência ele pode inserir na mobilidade, trazendo benefícios aos habitantes das cidades e, consequentemente, à estrutura urbana.

Ao se olhar para o ônibus deve-se contemplar o seu todo e não simplesmente o seu caráter da tração, como muitos pedem. Sem a prioridade ao modal em meio ao caótico trânsito, os modernos ônibus elétricos ficarão queimando eletricidade nos congestionamentos.

Mas, voltemos ao assunto da transição energética e as suas consequências sobre a falta de suporte.

Recentemente, o Grupo Santa Zita, operador do transporte coletivo na região da Grande Vitória, ES, adquiriu um, dos quatro novos ônibus urbanos com tração elétrica 100% a baterias que serão incorporados ao sistema local.

Visando promover uma avaliação técnica da novidade, que chega para inserir a região e os serviços no âmbito da sustentabilidade ambiental, o mencionado Grupo colocará o seu veículo na linha 515 que liga dois terminais (Campo Grande e Laranjeiras) distantes cerca de 40 quilômetros, numa topografia plana.

O ônibus possui 32 poltronas, sistema de ar-condicionado, amplo salão interno, além de preparação para a instalação de microcâmeras, monitor, sistema GPS e conexão de internet via Wi-Fi.

A revista AutoBus conversou com Murilo Lara, diretor-financeiro do Grupo Santa Zita, presente no Espírito Santo desde 1994. De acordo com ele, foram investidos R$ 1,7 milhão, sem a participação do Estado nessa aquisição. “Com investimento próprio e bem relevante, adquirimos esse ônibus para realizarmos testes e conhecermos, realmente, a tecnologia do elétrico”, comentou.

Murilo Lara

Numa análise financeira mais atenta, o valor do ônibus está um pouco abaixo do que está sendo praticado no mercado em virtude do menor número de baterias instaladas. Contudo, esse fato também proporciona aos veículos uma autonomia reduzida e diferenciada. “O Governo Estadual está comprometido com a implantação de dois sistemas de recarga de oportunidade nos respectivos terminais de passageiros. Por enquanto, isso não aconteceu e a empresa WEG irá nos emprestar um aparelho de recarga”, disse Murilo.

Num momento tão complicado vivido pelo sistema de transporte coletivo urbano, com a redução do número de passageiros transportados e consequente com perda de receitas e de competitividade, é viável ter a tecnologia da eletromobilidade espalhada pelo setor de modo a atender o conceito ambiental? De acordo com o diretor do Grupo, numa opinião particular, é necessário um equilíbrio entre a operação e os seus custos. “Para esse contexto se viabilizar, é preciso levar em consideração algumas questões ainda não respondidas sobre os investimentos, as baterias e os sistemas de recarga elétrica. Neste momento, ainda não conseguimos atingir uma escala que permita um sistema de transporte 100% eletrificado”, observou.

Ainda, na visão do executivo, a futura geração de motores a diesel Euro VI, com baixíssima emissão poluente, pode ser considerada uma alternativa viável e eficiente em relação ao menor impacto ambiental se comparada com a tração elétrica. “Hoje, vale a pena investir em um veículo elétrico que tem custo de aquisição suficiente para adquirir quatro ou cinco ônibus com motor Euro VI? Vivemos um dilema entre custos altos e tarifas cada vez menores. Para pensarmos em tecnologias inovadoras e modernas precisamos ter segurança e ser remunerados de acordo com o investimento feito”, disse Murilo.

Ainda, segundo o executivo, é preciso entender que sua visão não é a de resistência, mas sim de racionalidade quanto a tecnologia da tração elétrica num setor que tem pouca participação do poder público quanto a promover programas de incentivo às tecnologias.

De acordo com Murilo, o período de avaliação e testes com o veículo elétrico é de um ano.   

Como se vê, é necessário uma avaliação mais precisa em termos econômicos, com resultados viáveis para todos os envolvidos, não recaindo apenas no bojo do operador os altos custos de investimentos na moderna tecnologia de tração. O transporte urbano não é para amadores e seus desafios precisam de um exercício prudente para as suas soluções.

Imagens – Divulgação

2 Comentários

  1. Avatar

    Bastante coerente o artigo.
    Até que ponto é viável o emprego de ônibus elétricos em lugar dos tradicionais a diesel????
    E as novas tecnologias como células de combustível???

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    • Antonio Ferro

      Bom dia Max, por enquanto, o custo de aquisição é o impeditivo, contudo, há as questões sobre a eficiência e autonomia das baterias num modelo de serviço, como é o brasileiro, em que exige demais dos ônibus. Lembrando que na Europa, ônibus elétrico não leva mais 30 passageiros. Quanto a tecnologia das células, há também a indefinição de custos e por ser nova, ainda é desconhecida do setor. Mas, tende a ser o futuro. Vamos aguardar.
      Obrigado pelo contato.

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