Uma luz no fim do túnel

Aproximadamente 550 mil passageiros pagantes usam o transporte público diariamente em Curitiba. Este volume é 26% menor do que o registrado há dois anos – antes da pandemia

Por Osvaldo Born

Fim da pandemia, decadência dos aplicativos de transporte, aumento das opções de deslocamento com a oferta de biarticulados no eixo norte da Linha Verde, avanço das obras deste mesmo eixo até o bairro Atuba, na divisa com a cidade de Colombo, e, também, a etapa final das obras no eixo sul onde a ligação entre os terminais será possível com a ultrapassagem dos biarticulados da linha direta. Um cenário onde parece ser propício o renascimento da demanda do transporte coletivo de Curitiba ou pelo menos a reflexão dos cidadãos de que vale a pena optar pelo transporte coletivo por ônibus.

No entanto, dois fatos recentes atestam que a esperança de recuperação dos anos dourados está longe ainda. A chegada da oferta do deslocamento de passageiros em motos pelos aplicativos de transporte, com tarifas que competem diretamente com os ônibus regulares, e, também, das bicicletas compartilhadas, que são um balde de água fria para o futuro do modal, pois cada passageiro perdido no ônibus acrescenta números negativos ao sistema como um todo e à própria mobilidade da cidade.

A princípio, a municipalidade cogitou proibir o aplicativo para motos, porém há parecer favorável do STF e, com isso, o serviço já foi implementado. Já no tocante ao compartilhamento de bicicletas – serviço que iniciou há cerca de um mês -, a maioria das estações está instalada na área central, competindo diretamente com as linhas convencionais que atendem os bairros mais próximos do centro e que já agonizam com um custo alto para deslocamentos curtos e na maior parte do dia, “batem lata” mesmo tendo havido sucessivos cortes de horários e diminuição do tamanho dos veículos, visando otimizar a oferta e diminuir o custo.

No plano geral, além de não seguir a política pública de mobilidade, ignorando elementos do Plano de Ciclomobilidade da cidade, bem como dados técnicos da estrutura cicloviária e de demanda pelo uso da bicicleta como modal de transporte, tem-se a ideia de incentivar o uso das “bikes”, desde que sejam ofertadas como um serviço pago e que gere impostos e não um incentivo de que cada cidadão – consciente de seu papel na sociedade –, opte por alguns deslocamentos por intermédio de um meio mais sustentável, mas de forma complementar, por exemplo, em trechos curtos de casa até um terminal de transportes da região (aliás, nenhum terminal recebeu uma estação de bicicletas). A bicicleta sempre teve espaço especial em Curitiba, mas sempre foi vista como um veículo de lazer, tanto que boa parte da extensa e histórica rede de ciclovias liga os principais parques da cidade e tentativas anteriores de bicicletas compartilhadas tiveram péssimos resultados.

O modal de “bicis compartilhadas” também traz mais dois elementos ao caótico deslocamento dentro da região central. Primeiro ao dividir espaços com os demais veículos nas ruas e avenidas, sendo que, inclusive, foram pintados pictogramas em faixas demonstrando que ali os ciclistas poderão estar presentes, algumas até na pista central como caso da Rua Nestor de Castro, ignorando inclusive as regras mais elementares de segurança viária. Além disso, as estações “roubaram” muitas vagas de estacionamento na região central, algo que já é bem escasso. E cada vez menos o comércio central perde atratividade pelas dificuldades de se localizar uma vaga, inclusive que não seja prioritária, além das necessidades de deslocamento e desembarque de pessoas idosas. A prefeitura recebe seus impostos, mas aos poucos vai minando outras fontes de arrecadação com um modismo para a região central que, reforçamos, ignora as reais necessidades de deslocamento das pessoas que optam pela bike, especialmente pelo custo-benefício nos bairros periféricos. O público jovem deve ser o principal usuário do novo sistema, porém mesmo a Fase 1 de expansão da malha cicloviária, citada no Plano de Mobilidade, ficou de fora da rede de estações instaladas até o momento, pois previa a conexão entre pontos junto a campos universitários e integração entre diferentes sedes destas instituições. Segundo o site Plural Curitiba, citando a pesquisa de origem e destino (O.D.) realizada em 2017 e o Plano de Estrutura Cicloviária de Curitiba de 2019, indica que “as escolas e universidades são 38% dos destinos de quem usa bicicleta como meio de transporte, mais do que a média nacional, que é de 25%”.

Além disso, estes dois novos elementos tendem a piorar a segurança viária como um todo na cidade, pois são veículos onde os usuários, dividindo espaço com todo tipo de veículo de maior porte, estão mais expostos a acidentes que, mesmo de pequeno porte, podem causar traumas para uma vida toda. Vale rememorar o número crescente de ocorrências envolvendo veículos de duas rodas não só em Curitiba, mas no país como um todo. Enquanto isso, o transporte coletivo municipal por ônibus discute possibilidades para que o novo processo licitatório do sistema, previsto para 2025, efetivamente recupere passageiros e tenha custos mais atrativos aos cidadãos. Aproximadamente 550 mil passageiros pagantes usam o transporte público diariamente em Curitiba. Este volume é 26% menor do que o registrado há dois anos – antes da pandemia -, quando a média diária foi de 744 mil usuários pagantes. Na Câmara Municipal de Curitiba foi criada, pelos vereadores, uma Comissão Especial do Transporte visando discutir formas de reduzir o valor da tarifa e o novo contrato de concessão do transporte público. No entanto, neste contexto, aparentemente a prefeitura tem dado marcha a ré em alguns momentos.

Com certeza, para o transporte coletivo municipal, se há uma luz no fim do túnel neste momento, só pode ser de um trem vindo de encontro.

Imagens – Osvaldo Born

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