Washington por Lessa

Para quem se interessa pelo contexto do rodoviarismo brasileiro, relembrar um pouco da história é a oportunidade para conhecer os primórdios desse conceito, incentivado por um cidadão que esteve à frente da governança do País

Origenes Lessa foi um ensaista, jornalista, romancista, dentre outros atributos relacionados com letras aqui no Brasil. Soube, como poucos, extrair, de forma sutil e informal, os pensamentos do principal incentivador da implantação do sistema rodoviário em nosso País – Washington Luís Pereira de Sousa -, em um momento em que o “estradeiro” se encontrava em seu exílio na cidade norte-americana de Nova York.

No papel de político, Washington Luís foi prefeito de São Paulo (1913-1919, eleito duas vezes), presidente do Estado de São Paulo (1920-1924), senador (1925-1926) e presidente da República (1926-1930), cargos em que conduziu o estabelecimento de políticas públicas com os investimentos relacionados com a construção de estradas, a criação de fundos públicos para dar suporte ao tema e regras operacionais. Esse arauto do transporte rodoviário, foi, sem dúvidas, o personagem que consagrou o desenvolvimento brasileiro sobre rodas, tendo como lema – Governar É Abrir Estradas.

Lessa, por sua vez, trabalhando na cidade de Nova York em 1942, sentiu que era hora de entrevistar o político, exilado após a tomada de governo pelas forças armadas em 1930, dando início à um longo período governamental em mãos de Getúlio Vargas.

Contudo, o estradeiro estava fechado para qualquer tentativa de abordagem de entrevistas. Foi preciso que o jornalista brasileiro deixasse de lado sua intenção de imprensa, tendo uma conversa que fluiu sem formalidades, onde, então, muita coisa foi dita sobre o seu passado como governante e como pessoa.

Por intermédio de uma crônica escrita na revista Automóveis e Acessórios, edição de 1947, Origenes Lessa discorreu do olhar e do sentimento de alguém que havia sido alvo de calúnias que o colocavam no rol dos políticos pouco reconhecidos por seus feitos e iniciativas que olhavam para o futuro do Brasil de uma forma pragmática e provocante.

É injusto dizer que toda a imprensa nacional glosava de suas atitudes. Porém, parte dela considerava a abertura de estradas como algo vulgar, vindo de uma personalidade política que deveria pensar além dos caminhões que transportavam cargas e mercadorias. Mas, nos comentários negativos, os senhores portadores dos bicos de pena, esqueceram que sem estradas o Brasil passaria por perrengues que afetariam, e afetaram, o seu desenvolvimento, afinal, a comida e os gêneros de primeira necessidade chegavam como aos municípios?

O mencionado texto chegou a citar que o programa de ação adotado pelo causídico fora ressaltado, por importantes figuras da sociedade brasileira da época, como vulgar, sem imaginação, pois governar deveria ser uma coisa elegante, acadêmica, ato a ser realizado por governantes ilustres e seus nobres conceitos e não por aqueles que pensavam em estruturas relacionadas com a vida do povo, de meras estradas de rodagem ou preocupados com o preço do quilo do feijão. Veja que a falta de visão futura foi um ponto não observado para muitos que pensavam num Brasil de fantasias, elitista.

Bem ou mal, o processo de consolidação das estradas de rodagem contribuiu para a integração regional, visando o deslocamento das pessoas e o fortalecimento dos negócios mercadológicos. Enfim, se muitos relutam em aceitar o princípio histórico que colocou o rodoviarismo como orientador em nosso crescimento, a sociedade brasileira poderia ter cobrado e lutado para que o sistema de transporte sobre rodas e a sua infraestrutura tivesse a merecida atenção por parte dos gestores públicos a fim de promover critérios e medidas voltadas para a qualidade, a segurança e a modernidade dos serviços.

A mencionada crônica da publicação, que era do Rio de Janeiro, então capital brasileira, também abordou, até 1947, a trama rodoviária do estado que adotou Washington – São Paulo -, com os muitos feitos nesse sentido e o seu plano nacional, onde soube criar algumas das ligações por terra que tanto conhecemos, atualmente – a rota São Paulo entre Rio de Janeiro ficou reconhecida, naqueles tempos, como a protagonista. Foi nesse trajeto de ligação entre as principais metrópoles que as objeções foram difundidas, muitas das quais da Central do Brasil com os seus trens e seus temores na perda de público para os veículos automotores.

Os primeiros passos para a implantação de estradas de rodagem no País

Entretanto, ao construir a estrada, Washington Luís conseguiu dar um novo sentido comercial e oportunidades para que as cidades, margeadas pelo empreendimento, pudessem ter acesso aos grandes centros urbanos, mesmo que, as condições não fossem muito favoráveis. Ainda assim, sob a sua gestão federal, a via recebeu deveras atenções quanto a conservação e manutenção de sua infraestrutura, para que os veículos trafegassem em seu leito. Após o fim de seu mandato (1930) e até uma nova visão governamental referente ao assunto, isso em 1946, a estrada ficou a mercê do pouco interesse governamental em promover o rodoviarismo brasileiro.

O paulista de Macaé, como era conhecido Washington Luís, adotou o estado de São Paulo para promover seus ideais políticos e de gestor. Em uma publicação datada de 1922, a personalidade fora descrita como o grande motivador para que a redução entre o tempo e a distância fossem aspectos alcançados pela multiplicação de vias de transporte, em uma plataforma de governo que não ficou presa às falsas promessas, cumprindo com aquilo que lançara, com o propósito de promover a viação junto ao progresso nacional.

Após o exílio (que por um longo período encontrou-se ressentido por estar julgado e condenado sob decisões ideológicas), ele retornou ao Brasil em 1947 e, dez anos depois, faleceu na capital paulista. Este artigo não tem a intenção de evocar a defesa do político ou mesmo ser a biografia de uma figura determinada a proporcionar uma nova mentalidade num Brasil que ainda esboçava seus planos de crescimento. Seu objetivo é mostrar, para uma geração desconhecedora da história, o quanto as estradas têm tudo a ver com a formação da nossa Nação.

Imagens – Reprodução internet e extinta revista A Estrada de Rodagem

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