Passageiro deve estar no centro das discussões sobre mobilidade

Não se pode discutir mobilidade urbana nem obter sucesso se aqueles que o fazem repetem comportamentos orientados ao uso do carro

Por Gustavo Comeli, consultor de inovação da CWBUS

O crescimento populacional acentuado do último século trouxe grandes mudanças econômicas, sociais e ambientais para o planeta. Foram só nas últimas décadas, porém, que as consequências desse movimento desordenado ficaram visíveis. As cidades se moldaram reagindo aos acontecimentos, quase sempre expandindo a carência de infraestrutura e serviços à população. Diante desse cenário, organizar o ir e vir dos habitantes das cidades sempre foi e continua sendo um grande desafio para os governos e, agora, também para a sociedade organizada.

Pelo lado econômico, as matrizes de produção tiveram de ser ampliadas e diversificadas para atender às demandas de um número cada vez maior de pessoas. O processo de industrialização se deu de maneira exponencial e ao redor dos centros de maior adensamento populacional, devido ao acesso à mão de obra produtiva. Da mesma maneira, os trabalhadores também se concentraram em torno das ofertas de oportunidades de emprego e renda.

Assim, com mais gente nas cidades, houve mais deslocamentos, seja para acesso ao trabalho ou aos serviços de educação, saúde, consumo e diversão. O grande símbolo desse período de urbanização acentuada foi o automóvel, que se tornou sonho de consumo de muitas famílias. A partir desse contexto, pode-se entender a forma como as pessoas passaram a se deslocar nas cidades.

Com uma orientação muito forte ao uso de automóveis, as cidades foram respondendo de maneira desestruturada às novas demandas de sua população. O fato de mais pessoas se deslocarem em distâncias cada vez maiores, somado à maior produção e distribuição de renda – que propiciou mais acessos a bens e serviços –, trouxe gargalos quase intransponíveis aos grandes centros urbanos.

Mesmo grandes metrópoles da Europa que tradicionalmente investem em transportes de massa encontram dificuldades para reduzir os impactos desse crescimento exponencial e desordenado. Hoje, o automóvel é considerado por muitos o grande causador desses problemas.

Gustavo Comeli

Atualmente, sob o guarda-chuva das chamadas “cidades inteligentes”, o tema mobilidade urbana se sobressai, afinal ela determina qual é a capacidade que os habitantes têm de acessar produtos e serviços.

Em diversos congressos, eventos e debates, especialistas de organizações públicas e privadas expõem teses e conceitos sobre como seria possível resolver o problema da mobilidade urbana. Invariavelmente, sempre faltam duas variáveis importantes nessa equação: operadores do transporte coletivo urbano e o outro elemento fundamental, o usuário.

Não há ruas e vias exclusivas, ônibus, trens ou metrô que deem vazão à circulação de pessoas nas cidades se o cidadão não estiver no centro dessa discussão. Entender o ir e vir de seus habitantes, produzir uma política pública nacional e local que estimule e favoreça o uso de modais coletivos de transporte, integrados com alternativas individuais para dar mais capilaridade, previsão e precisão, além de conforto e segurança, são fundamentais.

E, a partir daí, entender que a nova realidade das cidades se faz com serviços orientados ao público principal, não mais apenas com produtos. A questão não é só se o ônibus ou trem tem conforto e qualidade, mas sim que benefício ou que tipo de problema ele resolve para a população. Foi isso que fez os aplicativos de mobilidade ganharem milhões de adeptos: foco no usuário.

Não se pode permanecer sentado em padrões estabelecidos no século passado para encontrar soluções para o futuro. Não se pode definir unilateralmente os futuros da mobilidade de uma cidade. Não cabe mais somente ao ente público este papel. É preciso flexibilizar concessões, ampliar e integrar modais, desonerar tarifas, buscar novas fontes de financiamento, inovar.

Não se pode discutir mobilidade urbana nem obter sucesso se aqueles que o fazem repetem comportamentos orientados ao uso do carro. Não se pode discutir cidades inteligentes se não houver fluidez no acesso a produtos e serviços em uma cidade. Mobilidade urbana não é somente sobre infraestrutura, ônibus elétrico ou bicicleta. É também, e sobretudo, sobre o ir e vir do cidadão!

Imagens – Divulgação

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