Por Rogério Pires, diretor da Divisão de Veículos Comerciais – Voith Turbo América do Sul
De acordo com o dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, aprendizagem é definida como o ato ou efeito de aprender, que, por sua vez, significa tornar-se apto ou capaz de alguma coisa mediante o estudo, observação, experiência ou advertências.
Reconhecer que necessitamos aprender nem sempre é algo fácil, pois isso nos obriga a ter certo nível de humildade e, por que não dizer, inteligência, para evitar incorrermos nos mesmos equívocos já cometidos por outros ou já ocorridos em momentos no passado.
A transição energética em curso, seja por necessidade, convicção ambiental ou até mesmo por mera abordagem política, tem gerado grandes desafios para o setor automotivo, principalmente quando falamos do segmento de pesados, nossos ônibus e caminhões.
Historicamente, temos seguido o mercado europeu em termos de tecnologia para veículos pesados, cujo desenvolvimento tem se baseado em legislações ambientais e de segurança. Nossas normativas PROCONVE seguem os parâmetros EURO, o que, até o momento, tem facilitado muito a introdução de novas tecnologias de motorização para o transporte urbano e rodoviário. O translado tecnológico tem ocorrido com certo atraso no tempo, mas com um nível de maturidade mais elevado, propício para as nossas severas e adversas condições de aplicação e de infraestrutura.
Ocorre que os colegas europeus apertaram de forma significativa as exigências legais e estabeleceram prazos desafiadores para o processo de descarbonização, dentro de um novo contexto geopolítico, onde os novos grandes jogadores buscam ganhar mercado com novas bases tecnológicas, tentando acelerar o processo de descarbonização através da eletrificação de frotas.
O transporte de cargas e passageiros passou a ser evidenciado como um dos vilões do aquecimento global. Por isso, fomenta-se a eletrificação urgente dos veículos, mas sem que existam garantias das condições operacionais essenciais para estes, como autonomia de deslocamento diário e capacidade útil de carga. O processo de desenvolvimento tecnológico por lá tem sido feito em velocidade e custos de desenvolvimento jamais vistos. Tem-se aprendido muito com veículos já comercializados, onde os frotistas são utilizados, como nunca, para o desenvolvimento final de todas essas novas tecnologias de tração e bateria. Todo esse processo tem gerado reflexões e aprendizados importantes que não podem ser desperdiçados por nós.
A Associação Europeia de Fabricantes de Veículos (ACEA) tem se posicionado através de manifestos importantes, seja especificamente no segmento de veículos comerciais ou de maneira geral sobre mobilidade sustentável.
Os fabricantes de componentes e veículos fizeram sua parte e já oferecem por lá diversas opções de veículos eletrificados; contudo, a infraestrutura não acompanhou essa evolução. Os custos relacionados a todo esse processo tem sido extremamente elevados e os subsídios cada vez mais escassos para suportar essa transição de maneira sustentável.
Sem a existência de elementos facilitadores para o processo de transição energética, frotistas não serão estimulados a investir em novas tecnologias. Pensando nisso, políticas públicas devem combinar metas ambiciosas para os fabricantes de veículos com condições igualmente ambiciosas, para permitir a aceitação pelo mercado de veículos com baixa ou zero emissões.
A diversidade de rotas tecnológicas também está sendo tratada como algo essencial para alcançar metas de descarbonização do transporte rodoviário e urbano. Regulamentações previsíveis e bem planejadas devem ser itens essenciais para garantir que todos os elementos estejam conectados em termos de tempo e tenham a devida sustentabilidade financeira.
Outros aspectos essenciais para um transporte eficiente, seguro e sustentável ainda não foram devidamente explorados, como a questão de conectividade e automação, extremamente importantes para atender novas matrizes energéticas e garantir maior eficiência energética e segurança veicular.
Neste contexto, parece que o Brasil deverá seguir rumos próprios, pois nossa matriz energética é mais favorável e pode ser explorada de formas distintas do que acontece em outras regiões. Podemos seguir “copiando” algumas soluções, mas devemos aproveitar os aprendizados já existentes no mundo para traçar nossos próprios caminhos, evitando as famosas “cascas de banana” posicionadas por interesses político-econômicos.
Imagem – Divulgação
Excelente texto Rogerio. Em meio a todo o ruido, util a alguns, uma voz clara que deve ser ouvida e pensada.