Por Rogério Pires, diretor da Divisão de Mobilidade da Voith Turbo para a América do Sul
Vivemos em uma das regiões mais “urbanizadas” do mundo, com algumas dezenas de metrópoles tendo mais de 1 milhão de habitantes.
Infelizmente, o processo de desenvolvimento de nossas cidades, com raras exceções, tem sido caótico, com destaque na questão de mobilidade urbana, a qual deveria ser um dos instrumentos básicos de indução ao crescimento organizado de uma cidade.
Um projeto de desenvolvimento urbano deve ter como premissa o planejamento de transporte, privilegiando sempre o coletivo. Infraestrutura viária, terminais de integração intermodal, sistemas inteligentes de controle e gestão, além de, obviamente, contratos claros e suficientemente robustos relativos aos serviços a serem prestados à comunidade, que deve ter acesso a estes por direito essencial.
Carecemos de políticas de estado que possam perdurar por meio dos diversos governos, sem sofrer distorções políticas através de ações midiáticas de pouco efeito positivo para a mobilidade, mas de elevado custo para a sociedade.
Mesmo dentro de um contexto negativo, devemos reconhecer que, através de ações isoladas, mas bem-sucedidas, nossa região ainda conseguiu ser reconhecida pelo desenvolvimento de sistemas tronco alimentadores de transporte de alta capacidade por ônibus, a exemplo, nossos BRTs. Porém, infelizmente, paramos no tempo, induzidos pela necessidade política de ser (ou parecer ser) o mais “verde” possível.
Falta planejamento urbano de qualidade, paramos de construir novos BRTs, a oferta de vias exclusivas segue muito vagarosamente, sistemas inteligentes de gestão de frota (ITS) inexistem na sua concepção ideal, mas não faltam anúncios de quantos veículos elétricos serão integrados às nossas cidades. Um salto tecnológico necessário, porém, muito difícil de ser bem-sucedido sem se pensar na infraestrutura necessária e como financiaremos essa transição. Isso tem gerado, na maioria dos casos, estagnação no processo de renovação de frota, piorando ainda mais a qualidade do serviço prestado, aumentando custos operacionais e elevando ainda mais a emissão de poluentes. Fazendo uma analogia com o futebol: um “gol contra”.
Nos fazendo refletir que discutimos intensamente qual é a melhor tecnologia para o telhado, sem ter o alicerce bem projetado para a nossa sonhada casa (ou até mesmo sequer sabemos como compararemos o terreno para construir a mesma).
Sistemas de transporte urbano de passageiros devem ser pensados nos aspectos de intermodalidade, de velocidade média, frequência e capacidade de passageiros a serem transportados por quantidade de energia e custos relacionados. Eficiência deve ser a palavra de ordem, pois qualquer perda no processo implica em maiores custos e falta de qualidade do serviço de transporte a ser prestado à população. Melhor ainda se conseguirmos operar com fontes de energia renovável. Importante ressaltar que os veículos devem servir à operação, e não o inverso. Não podemos investir em projetos de má qualidade, pois isso implica inevitavelmente em custos adicionais para a sociedade sem a contrapartida de melhoria dos serviços prestados.
Para um ano novo, espero continuidade na luta por um futuro mais sustentável da mobilidade urbana, em todas as suas perspectivas, por meio de um transporte coletivo mais robusto, suportado financeiramente pelo poder público e de qualidade para a população. Esse deve representar as necessidades de nossa sociedade, aplicando tecnologias que sejam compatíveis com a realidade de cada região.
Não nos faltam especialistas qualificados do setor, nem tecnologias que possam suportar as diversas rotas de descarbonização e uma transição energética sustentável. Precisamos combinar todos esses fatores de forma inteligente, focada no desenvolvimento de um transporte público atrativo para todos os níveis da sociedade.
Espero que nossos legisladores e gestores públicos não esqueçam de colocar o tão esperado Marco Regulatório dos Transportes Públicos em suas resoluções de ano novo, assim como projetos de qualidade sejam apresentados para que tenhamos, finalmente, investimentos adequados com impactos positivos na mobilidade urbana e meio ambiente.
Imagem – Divulgação
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