A carroçaria Diplomata e suas metamorfoses

Quem acompanha a história da evolução dos ônibus rodoviários brasileiros sabe muito bem do que se trata a analogia ao título deste editorial resgate

Nostalgia

Dentre os muitos modelos de carroçarias rodoviárias produzidas no Brasil, uma, em particular, consagrou-se por experimentar, ao longo dos anos em que esteve em uso, muitas transformações em seu design externo, propiciando-lhe um reconhecimento nas muitas frotas onde foi operada.

Estamos falando do modelo Diplomata, que foi desenvolvido e produzido pela extinta marca Nielson, hoje Busscar. A fabricante catarinense apresentou essa versão de carroçaria, ainda no começo da década de 1960, inspirada num modelo de ônibus norte-americano, projetado pela marca Flxible e que foi importado pelo Expresso Brasileiro de Viação. O surgimento da geração Diplomata deveu-se à um pedido inusitado, de uma transportadora da cidade de Mogi das Cruzes, em São Paulo, que desafiou a empresa de Joinville a criar algo inovador.

Assim, em 1962, sobre um chassi LP321 da Mercedes-Benz, surge no mercado a primeira versão da linha Diplomata. A carroçaria, com suas peculiaridades, acabou agradando o setor, fato que colocava os irmãos Augusto e Eugênio Nielson no jogo da produção de ônibus no Brasil. Será que eles imaginavam que seu modelo duraria tanto tempo em meio ao segmento do transporte rodoviário?

As primeiras unidades fabricadas do Diplomata

No ano seguinte, a família Nielson resolveu abandonar a marcenaria, atividade adotada em seu princípio para, exclusivamente, se dedicar à fabricação das carroçarias para ônibus. Dessa maneira, contando, apenas com poucos recursos num processo que exigia dedicação, esforço e muito trabalho, os pioneiros da marca catarinense arregaçaram as mangas para fidelizar o Diplomata no mercado.

De início, seu visual era formado pelo desenho do teto, em dois planos, janelas inclinadas, chapeamento frisado, faróis redondos, vigia traseiro com grades e acabamento interno simples.

No decorrer da década de 1960, a linha Diplomata manteve suas peculiaridades estéticas. Visualmente, se destacava perante a concorrência, com harmonia no teto de dois planos e outros detalhes construtivos, sendo uma carroçaria que equipava os chassis com motorização dianteira presentes no Brasil. Claro que, também, chegou a encarroçar modelos com motores traseiros.

O modelo logo caiu no gosto dos grandes transportadores

Não demorou muito para que as operadoras, de todos os portes, notassem as qualidades do produto e encomendassem novos ônibus para suas respectivas frotas. E, assim, foi até a virada das décadas de 1960 e 1970, quando, então, a empresa Carrocerias Nielson e seu departamento de engenharia resolveram promover modificações na área externa do modelo, bem como a introdução de novos componentes no salão de passageiros.

E essas transformações foram bem expressivas, a começar pelo desenho das áreas frontal e da traseira, com inclinações que ressaltavam o modelo e davam maior aerodinâmica. A grade dianteira, também, ficou maior, portando os mesmos faróis circulares, posicionados lado a lado. A área envidraçada expandiu seu tamanho, enquanto na traseira, as lanternas ficaram em formato retangular, havia um espaço para um luminoso que destacava o nome da transportadora e o vigia deixou de ter grades para ficar maior.

Desenho externo exclusivo e marcante

No acabamento do salão de passageiros, novos materiais passaram a moldar o espaço, com cores sóbrias e revestimentos diversos. As poltronas foram sendo melhoradas para promover conforto durante as viagens. Nesse decênio, destaque para o uso do WC e de um layout interno diferente, pensado por operadores que buscavam aumentar a comodidade de seus passageiros. Dessa forma, poltronas leito, bar e sistema de som eram adotados na configuração.

Em 1971, nova transformação, com a incorporação de três detalhes que podiam ser observados na carroçaria Diplomata – a moldura retangular dos faróis dianteiros, o conjunto da lanterna traseira em duas peças e o divisor inclinado dos dois planos do teto. Nesse mesmo ano, a encarroçadora apresentou uma versão diferenciada, chamada de Diplomata Jô, destacando o aspecto do rebaixamento do teto dianteiro em menor tamanho. Quase que a totalidade dos Diplomatas produzidos eram sobre chassis com motorização dianteira.

Linhas estéticas chamativas

Mas, isso já começou a mudar a partir de 1972, quando o mercado brasileiro de chassis vê a introdução de modelos com motorização traseira, propiciando aos motoristas e passageiros o conforto acústico no salão, como, também, um layout renovado do mesmo. Nesse contexto, Mercedes-Benz e Scania disponibilizam em suas gamas de produtos novas versões com suspensão metálica ou pneumática.

A década de 1970 foi importante para a evolução do transporte rodoviário, sendo um período marcante em termos de serviços, operações e tecnologia veicular. E a principal concorrente da Carrocerias Nielson, a gaúcha Marcopolo, atenta aos desdobramentos do setor, apresentou, em 1974, a sua carroçaria rodoviária Marcopolo III, modelo que foi, por muitos anos, o grande competidor do Diplomata.

A geração 3 de carroçarias Marcopolo foi a grande concorrente do Diplomata

Segundo o Relatório Anual da Diretoria 1976/1977, a carroçaria, cuja produção em série foi iniciada em 1975, obteve extraordinária receptividade junto aos empresários de ônibus no País e exterior, em função de seu moderno design e avançadas características técnicas. Suas vendas para o setor rodoviário, seletivo e turismo fizeram com que a produção de carroçarias rodoviárias Marcopolo (1976) se elevasse em 36% em relação a 1975. Com isso, foi mantida uma liderança tradicional neste setor – cerca de quarenta por cento dos modelos rodoviários produzidos no Brasil, em 1976, levaram o nome da Marcopolo.

Com a concorrente gaúcha colada junto aos seus negócios, a Nielson resolveu fazer mais algumas modificações no Diplomata, a partir de 1975, diminuindo o tamanho da grade frontal e posicionando os faróis, ainda circulares, na vertical. Na traseira, o conjunto de lanternas, ainda em duas peças, ganhou o formato horizontal.

A partir d 1975, novos conceitos no desenho externo

No ano seguinte, de forma a promover uma renovação visual no modelo, a fabricante de Joinville adota, na área traseira do teto, uma elevação do espaço, que serviria para a colocação do sistema de ar-condicionado ou mesmo, apenas, como apelo estético. Essa reformulação do acabamento externo recebeu o nome de Air Bus.

Traseira Air Bus

Em 1976, a Nielson apresenta o Diplomata BR, desenvolvido para uma de suas principais clientes, a Viação Garcia. A carroçaria tinha um projeto inusitado, com três faróis circulares na vertical e uma cúpula de maior inclinação no chapéu dianteiro. Este modelo vestiu o chassi BR 116 da Scania e não teve vida longa na gama comercial da encarroçadora.

Uma versão exclusiva para a Viação Garcia

A partir de 1977, novas modificações estéticas são adotadas pela engenharia da marca. Assim, a área frontal volta a ter um estilo reto, com maior seção do para-brisa, caixa do itinerário no interior (com a opção de ser externa), possibilidade de faróis instalados no para-choques e o formato de degraus no chapéu dianteiro e na traseira do teto. Junto a isso, pouco tempo depois dessas alterações, as carroçarias rodoviárias ficaram maiores, por meio do Decreto Federal n° 82.925, que permitiu modelos com até 13,20 metros de comprimento. E, um dos primeiros exemplos nesse porte, foi uma versão do Diplomata para a Auto Viação Catarinense.

Além do mercado brasileiro, operadores de países vizinhos foram grandes clientes a adquirirem o modelo, em várias versões, confirmando a qualidade e a durabilidade da carroçaria.

Durante a década de 1980, a Nielson reforçou o conceito da carroçaria, ressaltando novos aspectos construtivos, de segurança e conforto, sem perder o característico símbolo, que era o design reto e suas linhas estéticas harmônicas. Nos primeiros momentos do uso do terceiro eixo em ônibus rodoviários, a empresa não ficou para trás, desenvolvendo o Diplomata na versão 6×2 para importantes clientes que o utilizavam em linhas de longas distâncias. Outro exemplo de pioneirismo da marca foi o lançamento do Diplomata 380, carroçaria High Deck (piso alto, com 3,80 metros de altura externa), com amplos bagageiros e visão privilegiada ao passageiro, idealizada para linhas regulares ou o transporte turístico.

Uma das primeiras carroçarias com piso alto do Brasil

O constate aprimoramento do modelo foi a maneira da fabricante em promover melhorias em todo o seu conjunto. Em 1983, por exemplo, houve o redimensionamento da largura externa, ficando a carroçaria com 2,60 metros. Tempos depois, foi a vez da adoção de tipos diferenciados em sua concepção, com a introdução das Séries 310, 330, 350 e 380, em referência às alturas externas. Em suas configurações externas, os degraus foram substituídos por rampas no chapéu dianteiro e no teto da traseira.

Pelo lado da concorrente gaúcha, a Marcopolo, ela apresentou entre 1983 e 1984 uma nova geração de carroçarias, denominada G 4, trazendo modelos para todos os nichos de operação, mantendo-se na cola da empresa catarinense numa competição acirrada, onde o mercado decidia, em muitas vezes, por pequenos detalhes sua escolha por determinada marca de carroçarias.

No apagar das luzes de 1980, uma nova surpresa sacode o segmento dos ônibus rodoviários. Em 1989, sai de cena a linha do Diplomata e entra no jogo a nova gama Busscar, com uma verdadeira revirada estética proporcionada pela Nielson ao destacar a designação, o logotipo reformulado, o desenho diferenciado e outros elementos incorporados em modelos com apelo visual marcante e arrojado.

Diplomata – uma história consagrada no transporte de passageiros

Quanto ao Diplomata, em quase 30 anos de história, a carroçaria se fez um sucesso de mercado, de norte a sul, por sua notoriedade e pelo esforço de uma fabricante em promover ao transporte brasileiro produtos com elevada robustez, qualidade de acabamento e durabilidade.

Imagens – Acervo revista AutoBus e Memória Marcopolo

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