R$ 300 milhões não são R$ 300 mil

E mesmo que fossem R$ 300 mil ninguém, no mundo dos negócios corporativos, quer levar prejuízo ante a competitividade

O sistema paulistano de ônibus urbano, em seu afã para promover o processo de descarbonização em seus serviços, sem levar em consideração um período de planejamento e maturação quanto a implantar um modelo de eletrificação, tem provocado distorções na forma operacional e financeira que comprometem toda cadeia do transporte coletivo, causando até prejuízos, pois o investimento na substituição forçada dos ônibus a diesel por elétricos tem custado muito para os cofres municipais.

Um exemplo nesse contexto pode ser visto, recentemente, em meio às controvérsias relacionadas ao investimento em infraestrutura necessária para o sucesso comercial do intento. Mercedes-Benz, uma das fornecedoras dos ônibus elétricos para a capital paulista, revelou, recentemente, que sente na pele a falta de um plano de gestão pública que desvincula o modelo de financiamento dos demais aspectos presentes nessa transição.

Segundo Walter Barbosa, vice-presidente de Vendas, Marketing e Peças & Serviços Ônibus da Mercedes-Benz do Brasil, a fabricante tem a receber R$ 300 milhões da prefeitura paulistana (via operadores), referidos a 175 ônibus produzidos, entre 2024 e 2025, para algumas concessionárias que não conseguem operar esses veículos por não ter infraestrutura elétrica em suas garagens, que necessitam de uma rede de alta tensão para abastecer os sistemas de recarga. “Dentro do atual pacote que envolve estrutura e financiamento é preciso rever o modelo praticado, com o redesenho do contrato que exige a completa infraestrutura elétrica para a liberação dos recursos financeiros, o que não está acontecendo em virtude de a fornecedora de energia não estar cumprindo com as suas obrigações”.

Ainda, de acordo com o executivo, a Mercedes-Benz tem conversado com a prefeitura de São Paulo e com outros órgãos públicos de financiamento (BNDES é um deles) para revisar esse modelo de contrato, desvinculando o recebimento dos veículos produzidos da necessidade de implantação da infraestrutura de energia elétrica. “Do que estamos propondo, numa das possibilidades, é desvincular a produção e a entrega dos veículos da necessidade da infraestrutura implantada nas garagens. Produziu e entregou o ônibus, recebe. Outra sugestão é o contrato Turn Key, com cláusulas de multa, exigindo dos fornecedores relacionados com essa transição tecnológica, o cumprimento do que foi acordado”, explicou Walter.

Nesse imbróglio paulistano sobre o sistema de ônibus, ações mais ordenadas em prol da eficiência operacional poderiam ser adotadas, como a implantação de corredores aptos a dar fluidez ao sistema, proporcionando rapidez nas viagens e conforto aos passageiros. Contudo, preferiu-se comprar ônibus elétrico para um setor que pouco impacta nas emissões poluentes. E, com a proibição de aquisição de ônibus a diesel, a cidade ressente o envelhecimento de sua frota e a consequente perda de qualidade na operação.

A marca já forneceu 111 unidades de seu chassi elétrico eO500U para vários mercados nacionais, sendo que a cidade de São Paulo é a que conta com a maior parte dessa frota elétrica. Além de um produto próprio, a fabricante fornece apenas o quadro do chassi, com eixos, para que outra empresa do ramo faça interface tecnológica visando modelo 100% elétrico a bateria. Esse total alcança 325 chassis em parceria com a Eletra.

Na linha de atuação da marca em direção à descarbonização do transporte coletivo, outras alternativas podem ser desenvolvidas comercialmente e aproveitadas. Walter Barbosa comentou que há tecnologias que podem contribuir com as metas ambientais, como os biocombustíveis que não necessitam de uma estrutura específica de abastecimento, no caso, o HVO e o biodiesel. “Temos uma riqueza em biocombustível que pode ser combinada com a eletrificação em diversas circunstâncias encontradas no Brasil. Além do que, podemos, ainda, pensar em biometano, combustível que tem o poder da descarbonização. Tudo isso, claro, depende do planejamento para que não ocorra os mesmos erros desse processo de eletrificação”, observou.

O vice-presidente da Mercedes-Benz atentou para outro ponto muito importante visando a mobilidade sustentável no transporte público, que é a necessidade de renovação de frota dos ônibus a diesel, com investimentos em modelos Euro VI que reduzem drasticamente as emissões de Óxidos de Nitrogênio e de Material Particulado, gases altamente prejudiciais à saúde pública. “Por isso, programas de financiamento como o Refrota, por exemplo, são fundamentais para que as empresas possam renovar suas frotas com ônibus cada vez mais compatíveis com o meio ambiente. Em suma, com nossos ônibus elétricos e com os consagrados modelos a diesel com tecnologia BlueTec 6, a Mercedes-Benz reforça seu compromisso com o transporte sustentável, sem abrir mão da eficiência e rentabilidade para as operadoras”, afirmou.

Obs. – Este espaço não se cansa de reforçar que a mobilidade coletiva e os serviços de ônibus urbanos só voltarão a ser competitivos se houver um conjunto de medidas que priorizem o modal na cena, dando-lhe capacidade para ser atrativo perante outros modelos de deslocamento. Não é uma tecnologia de propulsão que fará isso.

Imagem – Revista AutoBus

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