Entre retomada, regulação e concorrência desleal: o balanço de 2025 do transporte rodoviário regular

"O balanço de 2025 mostra, portanto, um transporte rodoviário regular mais estruturado, consciente de seus desafios e ativo na construção de soluções"

*Por Beatriz Lima

O ano de 2025 confirmou o transporte rodoviário regular de passageiros como um dos pilares centrais da mobilidade brasileira. Mais do que consolidar a retomada observada nos últimos ciclos, principalmente após a pandemia, o setor atravessou o período enfrentando alguns desafios estruturais históricos (agora mais visíveis) ao mesmo tempo em que avançou em investimentos, modernização e qualificação do serviço. O balanço do ano revela um segmento resiliente, estratégico para o País, mas pressionado por distorções concorrenciais que exigem atenção permanente do poder público e da sociedade.

A demanda dos serviços, ao longo de 2025, manteve sua trajetória de crescimento consistente, chegando ao fim do ano com a expansão das viagens. A ABRATI (Associação Brasileira das Empresas de Transporte Terrestre de Passageiros) estima, para o encerramento do ano, um aumento de 18% nas viagens interestaduais regulares de ônibus em comparação com o volume registrado em 2024, crescimento baseado no comportamento observado nas férias de julho e ajustada a uma leitura realista do cenário de consumo nacional. Além disso, esse maior movimento vem reforçado pelo período de festas de fim de ano e início do verão, entre dezembro e janeiro, quando o transporte rodoviário reafirma sua vocação para atender grandes fluxos de passageiros. Somadas, as rodoviárias do Rio de Janeiro e de São Paulo devem movimentar mais de dois milhões de turistas e viajantes até 5 de janeiro, consolidando o período como um dos mais intensos do calendário anual do setor e provando que o ônibus caiu no gosto dos viajantes pela economia, segurança e conforto.

Mas esse desempenho não é pontual. Em dezembro de 2024, a procura por bilhetes já havia crescido 40% em relação ao ano anterior, levando as empresas a ampliarem a oferta de horários em até 42% para absorver o pico sazonal. Em 2025, a estratégia foi mantida — e antecipada. Para as semanas entre 19 de dezembro e 4 de janeiro, as empresas já colocaram à venda 35% mais horários, reforçando o planejamento e a capacidade de resposta do serviço regular. As rotas com destino a áreas de lazer e praias lideraram esse avanço, com aumentos expressivos nas bases comparativas do ano anterior. O dado reforça o papel do ônibus como principal indutor do turismo doméstico, especialmente em um país continental como o Brasil, onde a capilaridade das linhas regulares garante acesso a milhares de municípios não atendidos por outros modais.

Por trás desse crescimento está um setor que investe. Somente em 2025, as empresas rodoviárias regulares associadas à ABRATI investiram, aproximadamente, R$ 3 bilhões na renovação de suas frotas, com a aquisição de veículos de última geração, como os modelos G8 da Marcopolo ou da família NB1, da Busscar, além da incorporação de novas tecnologias e motores com padrão Euro VI, mais eficientes e menos poluentes. Trata-se de um esforço financeiro relevante, que evidencia o compromisso das operadoras com segurança, conforto, sustentabilidade e modernização contínua.

A frota das empresas regulares traz o contexto da modernidade e segurança

No entanto, o avanço do setor ocorreu em paralelo ao agravamento de um velho problema: a concorrência desleal promovida por operações irregulares. Neste ano, o transporte clandestino e o uso indevido do fretamento colaborativo como substituto informal do serviço regular ganharam ainda mais espaço. Embora o fretamento seja uma atividade legal, sua utilização para venda de passagens individuais, operação de rotas fixas e captação pública de passageiros caracteriza desvio de finalidade, criando um ambiente de competição assimétrica e prejudicial ao sistema como um todo.

Mais grave do que o impacto econômico é o risco à segurança. Operações fora do marco regulatório não estão submetidas às mesmas exigências técnicas, de manutenção, fiscalização e qualificação profissional impostas ao transporte regular. Por isso, o alerta ao passageiro segue atual: é fundamental desconfiar de preços muito abaixo do mercado, de empresas sem atendimento presencial e de viagens que não partem de terminais rodoviários oficiais. O transporte clandestino não coloca em risco apenas quem embarca, mas todos que circulam pelas rodovias.

Nesse contexto, o debate regulatório ganhou protagonismo ao longo do ano. O novo marco do transporte rodoviário interestadual, conduzido pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), tornou-se um dos eixos centrais de 2025. As normas atualizadas reforçaram critérios de autorização, exigências de segurança, regularidade operacional e responsabilidades das empresas. Embora tenham exigido ajustes e investimentos adicionais, representam um avanço necessário para garantir previsibilidade jurídica e equilíbrio concorrencial.

O setor está bem preparado para os desafios

As empresas responderam a esse ambiente com profissionalização e inovação. A digitalização da relação com o passageiro, a adoção de tecnologias embarcadas, o aprimoramento dos sistemas de gestão e a qualificação das equipes estiveram no centro das estratégias corporativas. A valorização dos terminais rodoviários oficiais também ganhou força, reafirmando esses espaços como ambientes seguros, organizados e essenciais para a garantia dos direitos do usuário.

O ano, também, foi marcado por transformações internas relevantes no setor. A ampliação da presença feminina no transporte rodoviário regular ganhou visibilidade, com as mulheres ocupando mais espaços de liderança, participação no debate institucional e posições estratégicas nas empresas. Trata-se de uma mudança cultural importante em um segmento historicamente masculino. Nesse contexto, movimentos como o “Elas no Transporte” ganharam protagonismo em 2025 ao estimular debates e ações voltadas à valorização da mulher no setor, sinalizando uma evolução já em curso no ecossistema da mobilidade, com práticas de gestão mais justas e diversas.

Na agenda ambiental, 2025 consolidou o ônibus regular como um modal coletivo de menor impacto ambiental por passageiro transportado. Em meio à preparação do Brasil para a COP30, o setor acompanhou tendências globais discutidas em eventos como a Busworld, que destacou avanços em eletrificação, segurança, digitalização e, especialmente, a valorização do motorista profissional — tema crítico diante da escassez de mão de obra qualificada. Podemos aguardar, para 2026, que alguns projetos sustentáveis em termos de propulsão limpa sejam apresentados para o mencionado setor, contribuindo, ainda mais, com o seu papel de proporcionar a redução da pegada de carbono.

O balanço de 2025 mostra, portanto, um transporte rodoviário regular mais estruturado, consciente de seus desafios e ativo na construção de soluções. O combate efetivo às operações irregulares, a aplicação equilibrada do marco regulatório, a continuidade dos investimentos e a valorização do serviço regular serão decisivos para o futuro do setor. Entre retomada e reinvenção, o ônibus reafirma seu papel estratégico na mobilidade brasileira e deixa claro que inovação e rigor regulatório precisam caminhar juntos, sempre com o passageiro no centro das decisões.

Imagens – Divulgação

Beatriz Lima é jornalista há quase 30 anos no transporte rodoviário. Atualmente, é editora da Revista ABRATI, atuando, também, na comunicação de empresas como a Guanabara e Rodoviária do Rio S/A, Socicam, compartilhando insights sobre mobilidade e comunicação

 

 

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