Por Diego Buss de Oliveira
O transporte coletivo passa por uma crise sem precedentes, com uma redução de demanda jamais vista na sua história, com um prejuízo estimado de R$22,4 bilhões ao longo da pandemia. Como se isso não bastasse, a elevação do preço do diesel de 70,8% nos últimos doze meses e o reajuste salarial da categoria, são outros ingredientes que refletem no equilíbrio econômico dos contratos de concessão pelo Brasil.
A separação da tarifa pública da tarifa técnica e as alternativas de receitas extratarifárias são objetos de estudo nas cidades brasileiras. Existe ainda uma expectativa de aprovação de um projeto de lei que obriga o governo federal a bancar gratuidade do idoso no transporte coletivo. Iniciativas, essas, que irão permitir à manutenção equilibrada dos sistemas de transporte e as tarifas baixas aos clientes.
Enquanto especialistas e técnicos da área tentam encontrar soluções para combater essa crise e para que o cliente tenha um serviço digno, na esfera política se observa uma briga entre todos atores envolvidos no processo. O poder público alega que o serviço ofertado ao cliente é de péssima qualidade, que existe má gestão da operação e inércia do setor frente aos novos desafios. Os operadores por sua vez alegam contratos desequilibrados, atendimentos deficitários, perda de passageiros ano após ano e a inviabilidade de manter um serviço de qualidade sem uma saúde financeira que permita tal prática.
A sociedade por sua vez, observa o tema com muita desconfiança, acredita na existência de conluio entre governantes e operadores e que existe uma proteção contra a abertura do mercado. Normalmente se manifesta contra aportar recursos públicos na operação do transporte.
Na prática não há mocinho e vilão nessa história. Governantes e concessionários têm as suas parcelas de culpa. O concessionário pelo seu ritmo lento de inovação e o governo por não impor limite, criar, nutrir e ajudar os operadores de transporte a crescer de maneira sustentável e de entregar um serviço atrativo ao cliente.
No meio desse fogo cruzado está o passageiro que convive diariamente com um serviço de baixa qualidade, ônibus velhos, lotados, longos intervalos entre as viagens ou até mesmo vendo seu serviço suspenso pela inexistência de uma demanda razoável. É o mais pobre dos pobres buscando uma forma de sair do sistema: “Quem está dentro querendo sair e quem está fora pensando em nunca mais voltar”.
Se por um lado se vê a deterioração do transporte coletivo, por outro se observa investimentos significativos em obras viárias para alargamento de vias, viadutos, pontes ou qualquer intervenção que priorize o automóvel.
O transporte passou a ser formalmente reconhecido como um direito social, figurando a partir de 2015 no artigo 6º da Constituição Federal, ao lado do direito à educação, à saúde, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância e à assistência aos desamparados.
A lei das concessões determina que “toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários” e que “serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas”. No entanto, na prática as tarifas são sempre elevadas para os passageiros e baixas para sustentar um sistema que satisfaça todas essas condições.
A pandemia pressionou o poder público e os operadores do transporte a resolver as necessidades dos clientes em constante mudança, fazer mais com menos, se reinventar e crescer. O momento não é de achar culpados, mas de buscarmos, juntos, as soluções para manter e melhorar o nível de serviço do transporte coletivo, permitindo acesso aos espaços urbanos a uma imensa parte da população, frequentemente desassistida por um serviço insuficiente ou por não ter condições de utiliza-lo.
Imagem – Reproduoção
Diego Buss Oliveira é engenheiro e Coordenador de Planejamento de Operação de Transporte na EPTC – Empresa Pública de Transporte e Circulação
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