Esta história começa há muitos anos, entre as décadas de 1950 e 1960, quando o mineiro Homero Fialho resolve, no alto de seus 18 anos, iniciar o transporte de cargas, lá na região compreendida pela Zona da Mata de Minas Gerais, na divisa com os estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo. O caminhão foi, por algum tempo, a principal atividade laboral, transportando café (para o Rio de Janeiro) e cana-de-açúcar, este último produto para as usinas localizadas nas cidades da região de Ponte Nova e Urucânia. Porém, foi em 1967 que uma mudança de rumo colocou Fialho no transporte de passageiros.
A nova atividade começou com uma jardineira Chevrolet, de 1952, na lida diária em transportar pessoas do distrito de Palmeira de Fora até Ponte Nova, distantes 20 quilômetros. O reconhecimento dos mineiros logo foi atestado à Fialho, que além dos passageiros, também levava as mercadorias (legumes, verduras, galinhas) de seus clientes em seu ônibus.
Simpatia e aceitação logo começaram a fazer parte do cotidiano do arrojado empresário. Um segundo ônibus foi adquirido por ele, pouco tempo depois, fato que possibilitou a realização dos serviços regulares na região de atuação. Fialho atuava na linha de frente de sua operação, como também nos bastidores, sendo mecânico, lavador e contabilista de seu negócio. Até 1974 corria tudo bem, quando um de seus ônibus se acidentou, mantendo-se na ativa com apenas um veículo. Esse episódio aumentou ainda mais o trabalho realizado pelo empreendedor.
Casado e com a família crescendo, os desafios sempre foram uma constante na vida de Homero, porém sem nunca desistir das adversidades que encontrava. Para renovar e melhorar os seus serviços, em 1976 partiu rumo à Niterói, RJ, visando comprar novos ônibus, indo até a empresa Auto Viação 1001, que estava anunciando a venda de 10 veículos. Não chegou a tempo de ter esse volume a disposição.
Mas, lhe restava uma unidade, o modelo Ciferal “Papo Amarelo”, de 1964, veículo que se encontrava em bom estado de conservação e que foi produzido pela extinta encarroçadora carioca Ciferal (Comércio e Indústria de Ferro e Alumínio Ltda.). Fialho não teve dúvida e arrematou o ônibus. Voltou para casa satisfeito com a aquisição. E é aí que começa uma trajetória familiar, unida pela ferramenta de trabalho e o gosto por guardar os melhores momentos de vida.
Em 1977, visualizando novo sentido em sua carreira empresarial, Homero se muda para a cidade mineira de Contagem, na grande Belo Horizonte, onde começou a realizar serviços de fretamento para a Sociedade Brasileira de Eletrificação com o seu Ciferal 1001, assim reconhecido. Seria o início para uma nova empreitada operacional, com a constituição, tempos depois, da HF Transportes Ltda., com os seus 14 ônibus.
Um fato interessante é que Homero proporcionou apelidos em seus veículos. Além do Ciferal 1001, teve alcunhas como Santa Maria, Esmeralda, Transpena etc.
O Ciferal virou xodó de Fialho. Entretanto, quase o perdeu, definitivamente, para um empresário de Contagem, que queria o veículo para as suas pescarias. Negócio fechado, o modelo foi se embora, mas quem o comprou desistiu, poucos dias depois, devolvendo o ônibus. Seria esse um sinal para dizer que o veículo deveria ficar na família? Parece que sim.
Com sete filhos, Homero contava com a ajuda do mais velho, Silvestre Fialho, em algumas operações nos serviços de fretamento. Aliás, desde cedo mostrando espirito empreendedor, Silvestre chegou a vender frutas com o pai, numa atividade paralela ao transporte, em uma perua Kombi que sempre estacionava na saída de Ponte Nova em direção à cidade de Viçosa, isso com os seus 16 anos de vida. Muito curioso, também trabalhou em uma outra empresa de ônibus, a São Jorge, na área mecânica e logo aprendeu a dirigir. Quando estava com 22 anos, resolveu investir em seu negócio próprio de comércio de autopeças.
Em 2002, a HF Transportes encerrou suas atividades, sendo que a frota de ônibus foi vendida por Homero, ficando apenas com o Ciferal 1001. “Quem sabe o neto queira o veículo”, dizia ele. Dez anos depois, a história de vida desse empreendedor chegou ao fim aqui na Terra, ficando como legado a memória, o esforço, o trabalho e a dedicação à família.
Silvestre não deixou para trás o sonho de seu pai, decidindo herdar o veículo para que a história tivesse novos capítulos futuros. Desde o final da HF, o Ciferal ficou sob a guarda da família Fialho. Assim como para nós, o tempo foi promovendo o envelhecimento do ônibus. Porém, esse guerreiro sobre rodas ainda se mantinha em pé para que pudesse se movimentar. O chassi LP-321 da Mercedes-Benz continuava forte para o que estava reservado.
Contudo, somente alguns anos depois é que o processo de restauro do ônibus iniciou-se de fato. Em 2017, deu-se a partida para que ele reestabelecesse sua característica original, de forma bem-acabada, livre das imperfeições causadas pelo desgaste operacional e do tempo. Com a ajuda da empresa Centauro Turismo, do amigo Júlio Cesar Diniz, da transportadora Rouxinol, e de Jeferson dos Reis, uma grande ação de reforma foi promovida, com muito profissionalismo e dedicação, sempre atenta aos detalhes e pormenores da estrutura.
O trabalho foi desafiador, sendo necessários esforços de toda a equipe e das pessoas envolvidas em virtude da captação de informações sobre o histórico veicular, reprodução de peças, repintura e do acabamento com esmero. Foi preciso desmontá-lo, quase que por inteiro, para se alcançar a perfeição. Foram gastos quase três anos numa restauração minuciosa, crítica e com observação aos muitos detalhes presentes na carroçaria e chassis.
Finalmente, em abril de 2020, a joia estava com novo visual, num padrão que faz referência aos seus primórdios, tanto pelo lado estrutural, como pelas características originais. O sonho estava realizado. O Ciferal 1001 tinha uma nova aparência e Silvestre pode contemplá-lo com muita satisfação. Ele também pode dividir com o seu filho, Muryllo, esse gosto pelo ônibus.
Em 2021, Silvestre nos deixou em decorrência de um mal maligno, legando ao filho a história sobre rodas que ressalta a trajetória de seu pai, sua família e seus negócios. Hoje, Muryllo, e seus 22 anos, salienta que a responsabilidade é muito grande para manter o ônibus vistoso e conservado, mas que é um sentimento desafiador que pretende continuar, quem sabe, para deixar a paixão para seu futuro filho.
Imagens cedidas gentilmente pela família Fialho
A Viação 1001 poderia comprar esse carro e colocar no museu da empresa em que pese que seja um carro que o atual proprietário tenha feito a restauração mas o lugar deste carro é no museu da Auto Viação 1001 , para fazer companhia ao 139 que está no museu da empresa
Bom dia. Infelizmente, é uma decisão que não está ao meu alcance.
obrigado pelo contato.
Editor