Sorocaba, localizada no interior paulista, é uma cidade que tem, nas bases de sua economia, os setores voltados para a indústria, o comércio e os serviços. É reconhecida por ter empresas intensivas em tecnologia, instituições de ensino e pesquisa, com um desenvolvimento relacionado à sua urbanização, que hoje conta com mais de 700 mil habitantes.
A cidade, também, vem se destacando por oferecer um modelo de mobilidade coletiva que contempla na implantação de corredores exclusivos para ônibus, com o sistema BRT (Trânsito Rápido de Ônibus), paradigma que tem o objetivo de promover aos passageiros a velocidade, o conforto e a segurança, além de rentabilidade operacional, bem como a qualificação ambiental para as cidades.
A revista AutoBus conversou com Manoel Ferreira, diretor de Operações da BRT Sorocaba. O sistema conta com a união de duas empresas (MobiBrasil e CS Brasil) que possuem um vasto conhecimento no setor de transportes. De acordo com a operadora, além de ser um sucesso, os serviços visam, também, a inclusão social, já que sua infraestrutura é acessível para pessoas com necessidades especiais, e a redução do impacto ambiental, suprindo a necessidade de uso de carros e motos pela cidade.
O BRT teve sua gênese por meio de um arquiteto paranaense, então prefeito de Curitiba em 1974 – Jaime Lerner. O conceito foi, aos poucos, sendo difundido, chegando até à países longínquos que acreditaram na ideia e renovaram seus sistemas de transporte coletivo urbano, sempre pensando em otimização operacional e um ambiente mais limpo aos seus moradores.
Revista AutoBus – O tema recebeu, há alguns anos, muita atenção por parte de governos municipais. Contudo, BRT acabou caindo no ostracismo e percebemos que os projetos em cidades brasileiras são ínfimos. Sorocaba foi um exemplo a parte, ao apostar no conceito. Podem traçar uma linha do tempo sobre como foi a escolha por esse modelo de mobilidade e o que foi levado em consideração em seu projeto?
Manoel Ferreira – A ideia de ter um sistema BRT na cidade de Sorocaba surgiu a partir do poder público. A gestão municipal identificou que essa seria a solução de mobilidade urbana mais adequada para atender a demanda dos passageiros.
Como uma empresa de transporte, vimos uma grande oportunidade, nos candidatamos e fomos aprovados. Assim, a empresa e o projeto BRT Sorocaba se tornaram o primeiro e único modelo de contrato do Brasil no segmento de ônibus, no qual a concessionária investe na construção do viário e na operação e manutenção futura de todo o sistema. Isso significa que, a empresa de ônibus é responsável pela elaboração do projeto, pela construção/requalificação das vias onde os ônibus passarão, pelo transporte de passageiros e, ainda, pela conservação de toda infraestrutura ao longo dos anos. Desta maneira, sendo imbuído de preservar a qualidade e eficiência do sistema.
Antes da implantação do BRT, a cidade tinha um transporte comum que contemplava somente ônibus e terminais que faziam os itinerários.
Agora, os sorocabanos são beneficiados com um novo sistema de transporte confortável e moderno. Dotado de segurança e eficiência que tornam os deslocamentos mais rápidos do que antes. Com a presença das faixas exclusivas, a viagem ganha mais agilidade e o passageiro consegue programar a sua rotina sabendo o horário que chegará ao seu destino.
Hoje, a estrutura é robusta com dois novos terminais (Vitória Régia e São Bento), dois corredores exclusivos (Itavuvu e Ipanema), cinco corredores estruturais, 22 estações, 77 ônibus modernos, 91 pontos de parada e um Centro de Controle Operacional altamente tecnológico e eficiente.
O projeto também contemplou o uso de soluções verdes para a redução de danos ambientais adotando o uso de energia fotovoltaica nos pontos de parada, nas estações e nos terminais, reuso de água da chuva nos terminais, iluminação em LED, sistema de brises para ventilação das estações e os veículos possuem redutor de poluentes e ruídos.
Por onde o BRT passa, todas as vias foram requalificadas e a cidade ganhou um novo mobiliário urbano com cobertura, assentos, tomadas USB, Wi-Fi, painéis informativos, totens, piso podotátil. Todos os veículos possuem ar-condicionado, monitores internos, GPS, câmeras, tomadas USB e internet. Outra inovação foi a ativação do embarque com o celular, onde o passageiro pode registrar sua passagem e girar a catraca utilizando a carteira digital Cittamobi.
Para oferecer o que há de melhor para o sorocabano, a empresa investiu mais de R$ 50 milhões em tecnologia de ponta para ter uma operação de alta performance e assertividade.
AutoBus – Como é a infraestrutura construída até agora? (vias com asfalto ou concreto, número de estações, extensão das vias exclusivas, número de ônibus, passageiros transportados diariamente, dentre outros equipamentos)?
Ferreira – Desde os ônibus ao mobiliário urbano e vias, a empresa estruturou o sistema para acolher todos os passageiros, inclusive, a população com deficiência e possibilitar que explorem os espaços da cidade. A estrutura do BRT é formada da seguinte maneira:
Dois corredores exclusivos, Itavuvu e Ipanema;
Dois terminais, Vitória Régia e São Bento, com rampas de acesso, corrimões, piso podotátil e embarque em nível;
Cinco estruturais (Sul, Centro, Leste, Binário e Hermelino Matarazzo).
22 estações com vídeomonitoramento, assistência sonora em tempo real via interfone, orientações em Braile, rampas, corrimões, piso podotátil, espaço reservado para cadeirante e embarque em nível que facilita a entrada no ônibus de forma segura e sem medo.
77 veículos adaptados com plataforma elevatória e assentos preferenciais para idosos, gestantes, obesos e deficientes visuais junto com o cão-guia. Além disso, há aviso sonoro que permite indicar informações importantes para os usuários.
91 pontos de parada com piso podotátil de alerta e direcional, rampas de acesso e faixa de pedestres para travessia próximo aos pontos.
O BRT Sorocaba implantou soluções que ampliaram o acesso de pessoas com deficiência (PCD) ou mobilidade reduzida ao transporte coletivo da cidade. Em conformidade com as normas técnicas e as leis vigentes no país, a operação foi projetada para auxiliar este público a realizar os deslocamentos com mais autonomia e segurança, dando suporte de ponta a ponta. Pegar um ônibus se tornou mais fácil e seguro para esses passageiros. Isso porque, agora eles possuem um perímetro urbano que os conduz até terminais, estações, pontos de parada e, por fim, o embarque.
O diferencial do BRT no quesito acessibilidade: a sinalização de piso (piso podotátil) que faz a indicação de direção e de alerta está presente num raio de 50 metros do entorno dos terminais, estações e pontos de parada, orientando sobre o trajeto para pessoas com limitação visual. Este mesmo recurso está disponível dentro das estações e terminais. As calçadas próximas ao BRT possuem guias rebaixadas e faixa de pedestres para facilitar a chegada do passageiro ao sistema. Há também rampas e corrimão nas entradas das estações e terminais que auxiliam a locomoção de cadeirantes, idosos e até carrinhos de bebê.
Ao todo, são transportados cerca de 53 mil passageiros por dia.
AutoBus – Em qual região da cidade ele opera? Como são os serviços alimentadores?
Ferreira – A operação do BRT está concentrada a maior parte na região norte da cidade, onde pegamos os passageiros nos terminais e corredores exclusivos e o levamos ao centro com rapidez e previsibilidade.
Para ampliar a cobertura, ainda temos a nossa rede alimentadora que circula nos corredores estruturais das zonas sul, leste, centro e sul, que leva o passageiro ao bairro com mais agilidade e de forma integrada, pagando um único bilhete.
AutoBus – O projeto e a construção do sistema foram realizados pelo poder público ou a iniciativa privada teve participação? Fale um pouco mais sobre esse aspecto. Até agora, quais são os resultados perante o público que acessa o sistema, há um retorno positivo?
Ferreira – A concessionária BRT Sorocaba foi a primeira empresa no Brasil a conquistar uma concessão precedida de obra para o segmento de transporte com ônibus. Nessa modalidade de contrato, a concessionária realiza o projeto, a implantação da obra, a operação e a manutenção.
No total, fizemos um investimento de 450 milhões em obras de infraestrutura, projetos, desapropriações, material rodante e ITS. Desse montante, R$ 133 milhões da subvenção da prefeitura de Sorocaba (R$ 127 milhões vindos do Governo Federal) e o restante de responsabilidade do concessionário (iniciativa privada).
Um ponto importante que deve ser lembrado é que, na maioria dos projetos semelhantes a este, o poder público investe na obra, faz licitações e depois cede a infraestrutura para que uma concessionária opere o transporte. No caso do BRT Sorocaba, a empresa privada aplica dinheiro próprio (cerca de dois terços do investimento total do projeto é da concessionária BRT Sorocaba e o restante é investimento do governo municipal), implanta o sistema, investe na frota e opera. Ao final do período de concessão, os investimentos em infraestrutura são revertidos para o próprio poder público.
Desde o início da operação, temos um retorno muito positivo em relação ao sistema de modo geral. 78% da população afirma que com a chegada do BRT o transporte coletivo melhorou na cidade. Itens como conforto, segurança e rapidez merecem destaque. Mais de 89% dos passageiros avaliam como ótimo/bom o conforto nas viagens, 88,5% consideram a segurança ótimo/boa e 87,2% avaliam o tempo de viagem como ótimo/bom. Esses números fazem parte da Pesquisa Sensor realizada pela Associação Nacional de Transportes Públicos (ANTP).
Ver esses resultados nos anima a manter o foco na melhoria contínua dos serviços de transporte para o passageiro.
AutoBus – O bom transporte, muitas vezes, está ligado à gestão pública municipal, com ênfase ao que o prefeito vai ou não optar em termos de mobilidade. Neste momento, Sorocaba segue sendo um exemplo na questão do BRT. Quais os planos para o futuro em relação a aumentar a rede? Ano que vem, novas eleições municipais. Não pesa o fator insegurança jurídica ou até mesmo, em gestão municipal com viés frente a continuar com o que é oferecido neste momento quanto ao sucesso do BRT?
Ferreira – Inicialmente cumpre esclarecer que o transporte é um direito social de todos e, por isso, uma obrigação do Estado, assim, o transporte necessariamente deve estar ligado ao Poder Público. Ocorre que, na maioria das vezes, o Poder Público não dispõe de elementos técnicos ou pessoais para a gestão do transporte coletivo. Razão pela qual, após o procedimento licitatório concede ao terceiro a exploração que, essencialmente, seria uma obrigação sua. Ou seja, o concessionário atua em seu nome.
Nesse sentido, qualquer alteração do sistema de transporte é, obrigatoriamente, originada do poder concedente, assim, no caso do BRT Sorocaba cabe ao município.
Hoje, a concessionária inicia as obras no Corredor Estrutural Oeste e, com ele, concluirá o projeto licitado e, por consequência, atenderá a população de norte a sul e leste a oeste de Sorocaba.
Referente a alteração de governo, os concessionários não temem qualquer mudança. Isso porque, os contratos de concessão, em sua maioria, passam por várias gestões. Ademais, temos consciência que o gestor, popularmente eleito, fará tudo que é melhor para a população e, como muito bem dito, o BRT Sorocaba é um exemplo.
Imagens – Divulgação
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