Ônibus a biometano – indústria brasileira está preparada para isso

Na busca por veículos com tração limpa para o transporte coletivo urbano, o uso do combustível renovável pode contribuir com as metas ambientais

Agrale e Scania são dois importantes nomes que produzem ônibus movidos a gás natural ou biometano. Ambas as fabricantes contam com um portfólio capaz de atender as demandas do mercado em diversos nichos operacionais. Recentemente, na capital paulista, houve a mobilização para se adotar esse tipo de veículo em seu sistema de transporte coletivo. Em meio ao Seminário Mobilidade Sustentável, realizado pela prefeitura paulistana, o tema do uso do biometano foi, amplamente, mostrado e debatido como forma de ser mais uma alternativa de tração limpa para reduzir os efeitos da poluição.

Edson Ares Sixto Martins, diretor-comercial e de marketing da Agrale, destacou que a montadora gaúcha começou a se envolver com o assunto do gás natural para ônibus em 2001, depois de uma provocação feita pela Petrobras no sentido de se ter um veículo movido com o combustível alternativo ao diesel. Aliás, foi a Agrale quem produziu, para o Brasil, o primeiro chassi de micro-ônibus a gás natural. “Desde o início procuramos promover a evolução em termos de motor capaz de atender todas as normas ambientais de emissões. Assim, conquistamos um know-how significativo nessa área, onde podemos oferecer, hoje, um produto adequado e que atende a norma Euro VI e os mais exigentes mercados de mobilidade limpa”, disse.

Esse produto que o executivo da Agrale cita é o chassi MA 11.0 equipado com o propulsor FPT NEF 6, de 200 cv de potência, 600 Nm de torque, seis cilindros, transmissão com seis marchas e tanque para acomodar 380 litros de gás. O veículo, em parceria com outra marca gaúcha, Volare, que produziu a carroçaria, é fruto do desenvolvimento voltado para otimizar as operações urbanas.

É um micro-ônibus, com 11 toneladas, para os serviços de alimentação aos grandes sistemas ou em linhas entre bairros, com uma conotação ambiental e econômica interessante para as muitas cidades que procuram um modelo limpo de transporte. O modelo em questão teve sua divulgação ressaltada nesse seminário do biometano acontecido em São Paulo.

Segundo Martins, seu produto traz muitas vantagens ao usar o biometano como combustível, como a pegada de carbono negativa, alcançada por um conceito que transforma poluição em tração limpa. “Temos visto uma movimentação do mercado em torno de mais opções energéticas que possam ser viáveis para se obter um transporte livre da poluição. A cidade de São Paulo deu-nos o exemplo ao promover esse seminário, pensando em novas formas de tração limpa. Outro aspecto é que a cidade pode ter capacidade de abastecer seus ônibus com biometano por ter uma grande rede de gasodutos que chegam as garagens. Além disso, as empresas fornecedoras de gás estão aptas a atender as operadoras com a infraestrutura necessária para o abastecimento dos veículos. O próprio sistema que abastece o combustível está bem evoluído, com um tempo semelhante ao do diesel”, observou.

Ao se usar o gás natural, há uma grande redução das emissões locais, como material particulado e óxido de nitrogênio. Agora, se o biometano é o escolhido, os níveis de CO2 podem ser reduzidos em até 95% em comparação com o diesel, sendo uma fonte energética muito competitiva.

Algumas grandes cidades brasileiras se mostram interessadas na versão produzida pela Agrale, com piso alto. Belo Horizonte, Guarulhos e Salvador já contam com unidades do veículo em seus serviços ou em operações assistidas. Contudo, a capital paulista não permite em seu sistema os micro-ônibus nessa configuração, de piso alto e dispositivo móvel de acessibilidade. No caso paulistano, somente ônibus com entrada baixa podem operar, conforme determina a SPTrans, órgão gerenciador do transporte sobre pneus, mesmo que os serviços sejam realizados em condições precárias em ruas esburacadas ou com topografia irregular.

O chassi Agrale MA 11.0 a gás

Segundo o diretor da Agrale, o foco principal agora seria viabilizar a tecnologia da propulsão a GNV e gás biometano e a estrutura de abastecimento nas garagens dos frotistas com veículos existentes. Caso a prefeitura flexibilizasse as normas de construção dos ônibus permitindo que os micro-ônibus sejam configurados com piso alto, os operadores iriam investir, de imediato, nos veículos de menor porte com motores a gás e as distribuidoras de gás viabilizariam a estrutura de abastecimento dos ônibus em suas garagens, fundamental para a continuidade a longo prazo do processo de descarbonização da cidade de São Paulo. “São seis mil ônibus nessa categoria operando em São Paulo. E, caso a prefeitura autorize o uso do chassi com piso alto, nem que seja por um período de licença especial por até três anos, atenderíamos o mercado local com disponibilidade para com o intento das medidas ambientais e teríamos tempo para desenvolver no Brasil o que já temos operando em outros países, como Argentina. Os transportadores estão interessados em investir nisso. Posso afirmar que, se o modelo já existente de micro-ônibus a GNV for autorizado a operar nas ruas paulistanas teremos a oportunidade de viabilizar o mercado para os ônibus a gás natural/biometano”, ressaltou Martins.

A capital mineira está avaliando o chassi de micro-ônibus movido pelos combustíveis alternativos

Aliás, a Agrale tem experiência com gás em uma grande capital sul-americana, com a operação de ônibus maiores, da faixa de 17 toneladas. Desde 2018, a marca está presente em Buenos Aires com o seu chassi MT 17.0 equipado com o motor traseiro de 270 cv, transmissão automática e suspensão a ar. “Neste ano, conquistamos um contrato de fornecimento de cinquenta unidades para o sistema local”, disse Martins.

Experiência de sobra

A Scania tem uma longa tradição em oferecer chassis com motorização a gás, sendo um grande competidor que pode contribuir com as metas da descarbonização do transporte, seja paulistano ou brasileiro.  Gustavo Cecchetto, gerente de Vendas de Soluções para Mobilidade da Scania Operações Comerciais Brasil, destacou que a fabricante tem uma visão que leva em consideração essa heterogeneidade quanto a combustíveis e modelos energéticos para o transporte de passageiros sobre pneus.

Para ele, o Brasil é o país das tecnologias que se harmonizarão em prol da redução da pegada de carbono, da desfossilização do transporte, com conceitos adequados às características do mercado brasileiro. “Nós, da Scania, reforçamos que não temos uma única solução que promoverá a redução das emissões poluentes vindas do transporte. E, nesse processo de transição energética, pensamos no gás natural até alcançarmos a maior escala do uso de biometano, um combustível com grandes vantagens ambientais”, disse Cecchetto.

Chassi urbano com 15 metros de comprimento equipado com o motor a gás

Segundo o gerente da Scania, há três pilares que devem ser observados junto às condicionantes operacionais – motor desenvolvido integralmente (nacionalizado) para o uso do gás, manutenção semelhante ao diesel, tempo de abastecimento igual ao diesel; o preço de um chassi é 20 a 30% a mais que um modelo a diesel e um terço de um ônibus elétrico e o potencial do custo total operacional que pode se assemelhar à operação com o diesel; quanto a sustentabilidade ambiental, o gás natural apresenta índices positivos quanto a reduzir a poluição e o biometano tem uma característica ímpar de transformar passivos em biocombustível. “Apesar da produção do biometano, ainda, não ser expressiva no cenário nacional, o potencial brasileiro para que esse combustível renovável surta efeito positivo é enorme. No seminário paulistano houve uma mostra que chegou o momento do gás, que ele pode ser uma boa opção para o transporte local e que uma tecnologia limpa não será o suficiente para alcançarmos uma mobilidade livre das emissões”, explicou Cecchetto.

Quanto ao mercado, o gerente da Scania observou que a fabricante vem conversando com diversos operadores, mostrando-lhes as vantagens, a evolução e a superação dos problemas do passado relacionados com o gás natural. Segundo Cecchetto, o sistema paulistano de ônibus é complexo e a alteração da matriz energética responsável por seu funcionamento não se alcança, simplesmente, por uma virada de chave. “Estamos trabalhando com total atenção para este momento que é o de aparar arestas, mostrando que o setor evoluiu e é capaz de atender aos quesitos ambientais do transporte. O mercado tem um estereótipo do gás que é lá da década de 1980, contudo, esse é assunto que avançou muito, com uma tecnologia que responde, perfeitamente, ao transporte limpo. Vivemos uma transformação que exige a participação de muitos envolvidos no setor para obtermos sucesso comercial. A hora do gás é agora”, afirmou.

Chassi K280 da Scania que está sendo mostrado pelo Brasil

Além de São Paulo, Goiânia vem seguindo nessa esteira de transformações tecnológicas, mostrando interesse em investir no gás no seu sistema de transporte coletivo, com um projeto que objetiva usar o biometano como combustível para a redução da pegada de carbono. “Também, estamos conversando com Curitiba, Campo Grande, Rio de Janeiro, além do que já apresentamos nossa tecnologia com Recife, para mostrar que a indústria está preparada para oferecer uma solução viável em termos de transporte limpo”, finalizou Cecchetto.

Imagens – Divulgação (Agrale – Elisiane Oliveira), Scania e Revista AutoBus

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Ônibus movido a biometano, por Juliana Sá, Relações Corporativas e Sustentabilidade na Scania

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