Em sua quinta edição, ainda realizada no Parque do Ibirapuera, na cidade São Paulo, o Salão do Automóvel, foi, mais uma vez, o espaço compartilhado pela indústria brasileira de ônibus com outros tipos de veículos produzidos nacionalmente. O evento, acontecido entre os dias 26 de novembro e 11 de dezembro de 1966, ficou reconhecido por apresentar, no segmento de ônibus, importantes progressos dos produtores locais de carroçarias e chassis quanto a modelos e tecnologia adotadas nos veículos.
Naquele ano, os estandes das fabricantes ressaltaram as mobilizações dos principais nomes envolvidos com o setor em torno dos ideais de se oferecer transporte com confiabilidade, rentabilidade, conforto e segurança por meio de novos paradigmas construtivos adotados em cada projeto.
Os ônibus expostos no evento paulistano deram um tom especial em termos de apelo estético, acabamento e conforto. Nomes como Caio, Ciferal, FNM, Grassi, Mercedes-Benz e Nielson, mostraram suas mais modernas concepções. Desígnio, estilo, aerodinâmica, componentes e elementos internos/externos foram aspectos que sobressaíram em meio a tantos conceitos adotados nas mais diversas representações veiculares a mostra.
A revista AutoBus voltou no tempo para resgatar a apresentação de alguns modelos de ônibus que se destacaram naquele V Salão, proporcionando uma renovação no segmento, precedendo aos mais atuais pontos de vistas dos produtos em operação, com suas inovações até então não encontradas por aqui.
Vamos começar este pequeno relato histórico com um ônibus que chamou a atenção do público que esteve no Salão do Automóvel de 1966. Ele foi enfatizado com o mais moderno ônibus brasileiro daquela década, com um avançado desenho externo e um layout interno cheio de requinte.
Tratava-se do modelo construído pela encarroçadora carioca Ciferal, precursora no uso do duralumínio na estrutura de suas carroçarias. A fabricante informou que foi buscar inspiração nos mercados europeu e norte-americano, além de consultas aos operadores brasileiros, para desenvolver seu produto, resultando num ônibus com uma concepção adiantada em 10 anos em relação à concorrência.
Ele trazia o primeiro sistema de ar-condicionado com controle individual para cada passageiro; salão de estar com mesas e poltronas separadas do salão de passageiros; sistema de comunicação entre o motorista e os passageiros; modernas poltronas leito; iluminação com foco dirigido; equipamento para o fornecimento de bebidas geladas ou café; janelas panorâmicas com vidros “ray-ban”; faróis retangulares e bagageiros passantes. A carroçaria era montada sobre o chassi FNM, equipado com motor D-11000 (175 cv) localizado transversalmente na traseira, transmissão angular (aproximadamente 45°) interligando o diferencial à caixa seca do motor e suspensão por molas semielípticas com lâminas longas.
Além do inovador veículo, a Ciferal salientava que já utilizando, comercialmente, peças de fibra de vidro em suas carroçarias, nas áreas da frente, traseira e no WC, tornando-se uma das primeiras empresas brasileiras a adotar esse material.
Porém, ainda no contexto histórico desse modelo, registros posteriores sobre ele, envolvendo novas apresentações ao setor, não foram ressaltados pela mídia segmentada e nem mesmo pela própria encarroçadora, por meio de material informativo.
De acordo com o pesquisador Carlos Asa, que acabou encontrando o exemplar desse ônibus, muitos anos depois, em um desmanche na Grande São Paulo (Desmanche do Peixoto, em Guarulhos, meados da década de 1980), a carroçaria, já destruída pelo tempo, revelou certas peculiaridades, principalmente da área da traseira, que não fora salientada pelas reportagens da época.
A recordação de Asa foi transferida ao desenho que ele mesmo fez, conforme pode ser ver nesta reportagem, destacando os principais elementos presentes na então área da traseira do modelo, que não tinha nome oficial ou nenhuma propensão para o fato. Aliás, as carroçarias Ciferal acabaram recebendo designações por mero acaso, como o termo Papo Amarelo, adotado no modelo rodoviário utilizado pela Viação Cometa desde 1961.
Quanto ao esboço promovido pelo pesquisador, pode-se ver uma série de elementos para renovar o desígnio das tradicionais traseiras de ônibus disponibilizadas na época, buscando criar um caráter único, em harmonia com o conjunto.
A ousadia nas linhas externas – A paulista Caio levou ao Salão a sua carroçaria mais aerodinâmica do mercado brasileiro. O Gaivota, então nome batizado no respectivo modelo, não deixou por menos ao seduzir quem passou pelo estande da encarroçadora, com seu desenho arrojado e leveza da estrutura (anunciou que pesava uma tonelada a menos que outros modelos convencionais).
A carroçaria fora criada para os serviços rodoviários realizados em rotas de médias e longas distâncias. O veículo exposto no evento tinha 19 poltronas leito, WC, parede de separação entre o posto do motorista e o salão, sistema de som, serviço de bordo, renovação do ar interno por meio de sistema elétrico, janelas com desenho inclinado, ampla área envidraçada e estava nas cores da operadora Única Auto Ônibus, pertencente aos diretores da Caio. Tal modelo teria importante participação na linha São Paulo/Rio de Janeiro por muitos anos. A quebra de paradigmas, ao tradicional conceito utilizado pelas fabricantes, rendeu à Caio um lugar de destaque no segmento de ônibus rodoviários.
A maior potência para as linhas rodoviárias – A poderosa Mercedes-Benz disponibilizava, naquele momento, ao mercado nacional de ônibus a sua linha de chassi com motor dianteiro e a versão monobloco (integral), com motorização traseira, denominada O-321 HL, produtos com grande aceitação dos operadores pelos atributos positivos em relação à mecânica, estrutura e confiabilidade. Porém, não desenvolviam tanta velocidade e a potência dos motores era reduzida.
Mas isso começou a mudar quando a montadora resolveu dar um salto tecnológico ao apresentar seu novo modelo de ônibus rodoviário, também na configuração monobloco, equipado com novo trem de força, mais possante, idealizado para os trajetos de médias e longas distâncias.
A Mercedes-Benz enfatizava que seu novo produto não era um simples ônibus montado em cima de um chassi de caminhão, mas sim um monobloco planejado para seu ônibus, sem nada de improvisação, feito para proporcionar o conforto, a economia, a segurança e o desempenho operacional.
Equipado com o novo motor OM 326, de 200 cv de potência (ampliando a força de tração e a capacidade de vencer subidas) e transmissão com cinco marchas, o veículo tinha 11,18 metros de comprimento e capacidade para transportar 36 passageiros, podendo ser configurado na versão Standard ou Leito, com vários itens de conforto a bordo.
Nas estradas o conforto e a segurança – A extinta marca Nielson, de Joinville, SC, expôs a sua carroçaria Diplomata, que havia conquistado a confiança dos transportadores por seu desenho e configuração com atributos de qualidade. No Salão, a versão para as operações em rotas consagradas foi mostrada sobre chassi Scania.
Aliás, por muitos anos esse tipo de carroçaria foi referenciada no segmento, sendo uma opção muito bem aceita pelos operadores rodoviários em todo o País.
A partir daquele ano, o ônibus recebeu uma nova identidade, definida pelo caráter do bom acabamento, da estrutura resistente e de menor peso, com um visual arrojado, capaz de chamar a atenção de seu público, ou seja, o passageiro, que cortava o País de Norte a Sul nas mais longas viagens. A indústria brasileira do veículo, de então, dava um expressivo passo rumo ao seu futuro e à modernidade, com a experiência adquirida ao incorporar novos recursos tecnológicos nos chassis e na promoção de métodos inovadores na construção das carroçarias.
E assim termina mais um capítulo da história da evolução do ônibus no Brasil.
Imagens – http://showroomimagensdopassado.blogspot.com/, Reprodução internet, Carlos Asa, Reprodução Material Informativo
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